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Você estão cansados de saber que eu piro nas pessoas que desafiam o circuito da moda e dão certo fazendo tudo ao contrário deste mercado acelerado. São pessoas escondidas, contentes em fazer o que gostam de fazer bem, sem fazer muito estardalhaço. Tem um movimento artesanal muito incrível acontecendo em Los Angeles, com produtos locais feitos de maneira old school com materiais e técnicas que formam os ingredientes certos da autenticidade.  Uma destas pessoas se chama Julian Imrie, conhecido por sua alegria e pelas botas magníficas que faz em Los Angeles. Com eu disse no Instagram, o Julian tem uma história de vida digna daqueles comerciais de Homem Mais Interessante do Mundo.

Ele nasceu na Inglaterra e se mudou para as colônias francesas no Caribe aos sete anos. Ele voltou para Londres após passar um ano em um barco, e por lá estudou até se mudar com a família para Long Island. O pai trabalhou como fotógrafo de moda nos Estados Unidos e Julian seguiu os mesmos passos, largando a faculdade para como assistente do fotógrafo Bruce Weber. Desde então trabalhou em um rancho em Montauk, vivei em uma comunidade Amish na Pensilvânia, passou um tempo na frança aprendendo a curtir couro e fez uma viagem de Los Angeles até o Brasil… de bicicleta. Conheceu o Nordeste, chegou até Minas Gerais, rodou as cidades históricas, e seguiu rumo ao Sul. Foi por aí que ele resolveu viver uma vida simples, causando o mínimo de dano ao ambiente enquanto faz botas.

 

A cultura do desperdício vai tornando tudo descartável, inclusive botas. Uma boa bota custa mais do que uma similar mal feita, mas se fizermos as contas acaba saindo mais em conta, pois se for boa de verdade vai ter uma vida útil bem mais longa, além de estilo e elegância atemporal. A qualidade economiza, e as condições económicas e do meio ambiente estão nos forçando a parar de ignorar o que consumimos. Buscar a qualidade sobre a quantidade é a chave para uma vida mais sustentável. As botas da Julian Boots são um exemplo extremo, pois ficam uma categoria além do necessário qualitativo, entrando no reino do valor sentimental e imensurável.

Porque eu acho legal esse movimento silencioso? Olhe com atenção as revistas e publicações voltadas para a moda masculina. Elas mal conseguem disfarçar que são um grande outdoor para produtos supostamente sofisticados e muito caros, orientados por tendências (sejam elas mainstream ou alternativas), estilistas nadando no dinheiro e artistas patrocinados. Essas publicações não fazem referência a pessoas como o Julian porque elas, de modo geral, não fazem propaganda. O esforço é concentrado em fazer um excelente produto que fala por si só, com materiais, detalhes, acabamento, e construção que não podem ser comprometidos pela pressão da demanda. E assim o trabalho que realizam permanece anônimo e alheio aos arrasos da moda.

O que é mais especial nas botas do Julian, na minha opinião, são as formas (lasts). Tá certo que o material é incrível, em couro horween, couro shell cordovan, e sempre peles impecáveis. A construção é palmilhada, padrão básico para uma bota realmente acima da média. O acabamento também é de primeira, com muitos pontos por centímetro e costuras perfeitas. Isso é o mínimo de se esperar de um produto deste nível, apesar de  muitas botas e sapatos deste preço pegarem alguns atalhos. A diferença das botas dele está nas formas, que eu acho bem balanceadas e maravilhosas.

A operação é bem pequena, e fazer pouco é muito mais difícil, caro e demorado do que fazer muito. Na produção pequena você trabalha sem o luxo de fazer milhares de protótipos até você descobrir como terminar de maneira consistente e eficiente. Fazer uma amostra é um trabalho árduo e você não tem uma equipe para delegar. O pequeno produtor precisa ser preciso e detalhista em cada etapa do processo, e todos os envolvidos precisam trabalhar sem ter margem de erro, pois os custos de desenvolvimento para colocar um produto em produção são geralmente a maior parte das despesas. A máquina entra  onde ela é necessária para melhoria, e não onde ela ganha mais tempo. O que é melhor na mão, é feito à mão. Os benefícios a gente sente no conforto e com o tempo. Em uma operação maior o funcionário faz apenas uma dessas operações todos os dias. Ele realiza uma etapa 300 vezes ao dia, sempre passando o produto para o próximo da linha. O foco é em velocidade, continuidade e eficiência.

A quantidade é um número, e quando esse é o foco de uma marca ela tem consumidores que ficam indo e vindo dentro, flutuando conforme a onda do momento. A qualidade é tudo em uma bota Julian Boots. A expectativa é atender o cliente com o melhor e a melhor experiência de uso. Observando o Julian e sua equipe conversando eu vi alegria, vi encontros com clientes, fãs e amigos, no mundo inteiro, pessoas que respeitam o que ele está tentando fazer e que apreciam a luta contra o aparentemente impossível. Muita gente ainda prefere considerar estiloso e bom o que aparece nos anúncios e faz barulho, pagando um preço alto e entrando no ciclo das estações. Quietos estão os Julians do mundo, uns mais mestres e outros mais simples, e cada consumidor que procura pode decidir o que é realmente valioso.

 

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  • Disse tudo, perfeito, compartilho desses pensamentos. Está de parabéns pelo site,a muito procurava algo nacional com este conteúdo. Estou muito contente.
    Abraços.

Publicado por
Lucas Azevedo